É possível adorar a Deus produzindo
diversas formas de arte? E por que não há muitos escultores, pintores e
ilustradores nas igrejas brasileiras?
Deus é criativo e a prova disso está na
natureza e em nós também. É Ele quem pinta o mais belo pôr do sol, quem esculpe
os montes e montanhas mais incríveis, quem cria as melhores personalidades e
etc.. Desta forma podemos classificá-lo como um artista que produz perfeitas
obras artísticas. Como cristãos, temos atingido certo patamar artístico de
qualidade, mas essa arte muitas vezes fica restrita à dança, música e
interpretação. Mas essas são as únicas formas de expressão que podem ser
praticadas por um cristão?
É possível permanecer firme aos princípios do cristianismo e desenvolver formas
variadas de arte?
Inicialmente é preciso analisar a
separação que se faz no Brasil sobre o que é ‘cristão’ e o que é ‘secular’. O
primeiro, em tese, é aquele que tem como único objetivo adorar ao Criador. O
segundo, em contrapartida, é aquele que deve ser evitado pelos crentes e é
constantemente demonizado. Por exemplo, uma música escrita e cantada por uma
pessoa que professa a fé cristã e fala sobre Deus em suas letras é chamada de
música cristã, evangélica, gospel – mesmo que sua composição apresente graves
erros teológicos. Porém, uma música que fala de princípios fortemente cristãos
como amor, respeito, compaixão e justiça
social, mas não é interpretada por um artista cristão passa ser taxada como
mundana, secular e a mesma comparação pode ser feita em relação a outras formas
de arte.
A separação atual entre arte sagrada e
secular é uma questão que levanta muita discussão e há quem defenda diferentes
pontos de vista. Por exemplo, Jon Foreman, cristão e vocalista da banda
americana Switchfoot, quando perguntado sobre por que não citava Deus em suas
músicas, respondeu que Cristo morreu por ele e não por suas canções, elas não
nasceram de novo, portanto, não têm o direito de serem consideradas cristãs,
mas que ele, como seguidor do Messias deve refletir seus valores em tudo que
faz, mesmo que em suas canções não fosse encontrado o nome Deus. É um ponto de vista polêmico
mas que deve levar à reflexão. Considerando outras profissões, um engenheiro
cristão que não faz obras necessariamente cristãs está negando sua fé ou
pecando contra o seu Senhor? É possível que todos digam que não. “Todos nós
podemos fazer de nossos trabalhos profissionais (seja a engenharia, seja a
música) adoração ao Pai, basta sermos honestos, justos e excelentes naquilo que
produzimos e oferecemos ao mundo, com a mente fixa em Deus”, afirma o cristão,
músico e mestre em Educação, Arte e História da Cultura, Sérgio Pereira.
Ter o foco em Deus é o principal
argumento de quem defende que a arte seja usada tanto para a pregação do
evangelho quanto para apreciação. Valorizar a criatividade humana é reconhecer
a criatividade do próprio Deus, que é Senhor de todas as coisas, inclusive das
artes. Por isso, é importante incentivar sem discriminação outras manifestações
artísticas por parte dos membros nas igrejas brasileiras. Para Sérgio Pereira,
até mesmo os espaços físicos podem ser uma forma de incentivo: “Os templos, com
suas várias salas, têm um potencial enorme de difusão das artes, como
exposições, mostras
e festivais de fotografia, audiovisual (cinema), pintura, escultura,
quadrinhos, artes gráficas digitais, instalações, performances e tantas outras
linguagens artísticas”, explica o professor.
Mas iniciativas como esta encontram uma
barreira forte: preconceito. Há preconceito contra as variadas formas de arte;
uma decisão unilateral sobre o que é sacro e secular (no caso de obras de
escultura e artes gráficas e plásticas) e o mais grave dos preconceitos: contra
os artistas. “Uma maneira de observar isso está no fato de muitos músicos,
mesmo sendo profissionais, não serem pagos pelas igrejas locais para exercerem
seu trabalho”, lembra Sérgio. Ainda segundo o professor, a visão que a
sociedade, de forma geral, tem do artista é alguém que não trabalha, “criou-se
na mentalidade do brasileiro
a ideia de que ‘artista bom é aquele que faz sucesso’", o que contraria a
verdade, em que muitos brasileiros comuns e simples fazem arte de qualidade e
não são reconhecidos pelo seu trabalho, talento e esforço.
Não se pode ignorar o fato de que a arte
é uma poderosa ferramenta evangelística, seus resultados são incontestáveis,
mas não se pode sustentar o pensamento equivocado de que a boa arte cristã deve
ser utilizada apenas com esse fim. Ela pode ser usada, inclusive, para
conscientizar cristãos e não cristãos a respeito de temas importantes como
política, economia, meio ambiente e problemas sociais. E como aponta Sérgio
Pereira, é raro encontrar, no Brasil, um artista cristão (principalmente na
música) que defenda essas causas à luz da Bíblia, mas quando perguntado se
existe uma luz no fim
do túnel para esse impasse, ele é esperançoso e afirma: “Existe e começa pelos
seminários e depois pelos púlpitos das igrejas locais das diversas
denominações. Apesar de utilizarem a arte (e em especial a música) em todos os
eventos eclesiásticos, falta informação e reflexão mais aprofundadas nesses
ambientes quanto ao papel dos cristãos - que são artistas - na sociedade.
Enquanto formos igreja só para os de dentro, a mentalidade da maioria de nossos
artistas será a mesma: mais luz em ambientes iluminados ou mais sal no
saleiro”.
É
importante que o cristão faça todas as coisas com o intuito de adorar o
Criador, mas com ações e comportamentos e não apenas com palavras vazias. Um
cristão pode ser embaixador de Cristo em um escritório, numa sala de aula e
também numa exposição de sua arte. Jesus pode ser visto tanto na vida e obra de
um pastor quanto na de um ilustrador de histórias em quadrinhos. Pessoas podem
ser atraídas a Deus por uma música que fala sobre seus tributos ou por uma
fotografia. Cristo pode ser encontrado em literaturas religiosas ou de fantasia. Depende do olhar de quem
consome a arte. O que não pode ser deixado de lado é a sinceridade de coração e
a adoração, independentemente da profissão escolhida. Até porque, adorar a Deus
vai muito além do que cantar e dançar músicas que falem sobre Ele.

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